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Resenha: O Nariz, de Nikolai Gógol e a Literatura Fantástica

Atualizado: 29 de set. de 2021



Imagine, um dia, acordar de manhã, caminhar até o banheiro, lavar os olhos e perceber algo diferente na musculatura de sua face. Como se algo faltasse. Você esfrega os olhos mais uma vez, e assim, repara melhor. Algo, de fato, está faltando. Algo importante. Seu nariz. Começa, então, uma luta consigo para descobrir em que parte havia deixado o nariz e como este se descolou de seu rosto.

Em 1836, é publicado na Russia, O Nariz, conto satírico russo, da autoria de Nikolai Gógol, escritor que compõe a chamada era de ouro da literatura russa. O conto apresenta diversas características do gênero fantástico, esse que tem como fator marcante o encontro entre realidade e o sobrenatural. O elemento mais acentuado entre todos, com certeza, é o da duplicidade entre o homem e seu nariz, que, fugindo dele, passa a ser outra pessoa. Vai à igreja, participa de reuniões e, inclusive, é de uma patente maior que a de seu antigo... dono? Um leitor mais achegado à literatura fantástica, pode perceber uma familiaridade entre O Duplo (1846), do também russo e herdeiro de Gógol, Fiódor Dostoievski, ou ainda, William Wilson (1839), de Edgar Allan Poe. Isso acontece porque essa ferramenta é usada nas escritas desse gênero para expressar a finitude do ser.

Algo em comum entre esses três textos, é que, os duplos dos personagens principais o superam de alguma forma. No caso de Poe e Dostoievski, isso se dá no decorrer de toda a narrativa e suas conquistas estão sempre acima das dos protagonistas, seja moral ou financeiramente. Quanto ao conto de Gógol, o simples fato do nariz de Kovaliov ter uma patente mais alta que a dele próprio é um insulto ainda maior a ele do que ter se desprendido de sua face.

Nesse conto, Gógol usa do humor aliado a esses fatores para criar um incômodo no leitor que, por diversas vezes, se encontra rindo da situação séria de um homem que sofre pela falta de uma parte de seu corpo, além de fazer uma crítica à sociedade russa de mil e oitocentos, sendo pela narração da preocupação que Kovaliov expressa em aparecer diante de seus superiores com uma parte tão aparente de seu corpo faltando; no ato de esse prestar uma queixa na delegacia para tentar encontra-lo, destacando a burocracia pertencente à época, ou ainda, à delegação de cargos civis em São Petesburgo, onde até mesmo um nariz poderia ter uma patente alta.

Esse não é o único conto em que Gógol faz uso do recurso do duplo, outros dois contos que se destacam em sua biblioteca são A briga dos dois Ivans (1834) e O Retrato (1835).


Por Camila Machado

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